Sebenta do Superior
terça-feira, junho 01, 2004
 
Exames nacionais começam hoje debaixo de críticas

José Manuel Fernandes, director do Jornal "Público", volta a criticar o actual sistema de acesso ao ensino superior, no preciso dia em que teve início a época de exames nacionais do ensino secundário.


«Exames Sem Futuro
Por JOSÉ MANUEL FERNANDES
Segunda-feira, 14 de Junho de 2004

Os exames nacionais no final do Secundário que hoje começam não são o melhor sistema de escolher quem entra nas Universidades pois deveriam ser estas a escolher os alunos que querem receber

Dezenas de milhares de estudantes do 12º ano começam hoje a realizar os seus exames nacionais. Dos resultados que neles obtiverem vai depender muito do seu futuro, pois poderão conseguir, ou não, entrar os cursos que desejam.

Todos os que já fizeram um exame sabem que estes têm sempre uma componente aleatória. Mas também sabem que, sem exames, é difícil encontrar formas de ordenar os alunos de acordo com os seus conhecimentos com um mínimo de justiça. A divulgação, nos três últimos anos, dos "rankings" nacionais, escola a escola, dos resultados obtidos pelos seus alunos nos exames nacionais e a sua comparação com a chamada "nota interna" permitiu mesmo ver que, sem eles, as injustiças relativas seriam insuportáveis. Na verdade, enquanto existem escolas exigentes onde os alunos obtêm, em média, notas internas inferiores às notas dos exames nacionais, noutras passa-se o inverso e tais notas surgem de tal forma inflacionadas que é legítimo suspeitar se isso não acontece para facilitar a entrada em certos cursos aos seus alunos (a nota interna conta para o cálculo da média de acesso).

Temos assim um sistema em que subsistem algumas injustiças relativas que são apenas parcialmente corrigidas realizando uma prova contingente: eis um sistema com que não deveríamos estar satisfeitos.

A questão é saber: existe alternativa? Existe, mas implicaria que as Universidades abandonassem a cómoda posição de acolherem os alunos que este sistema lhes destina e fossem elas a estabelecer as regras para o acesso a cada um dos seus cursos. O que implicaria, também, a necessidade de realizarem provas específicas de acesso e obrigaria os estudantes que se quisessem candidatar a diferentes cursos em diferentes Universidades a terem de prestar múltiplas provas.

Parece complicado e é, mas também é o sistema adoptado nas melhores Universidades do mundo, naquelas que se distinguem pela sua excelência e onde os lugares são cobiçados pelos melhores alunos. Por ser complicado, talvez não fosse um sistema generalizável a todos os cursos, mas há alguns onde as suas vantagens já hoje são evidentes, como os de Medicina. Até porque é hoje consensual que as astronómicas médias (e valeria a pena ver, comparando com outros países, até que ponto são inflacionadas...) requeridas para entrar nesses cursos não são, sequer, a forma mais correcta de encontrar as melhores vocações médicas.

Por ser complicado, por exigir mais das Universidades e dos candidatos mas por permitir uma maior justiça e igualdade de oportunidades, um sistema que acabasse com a actual centralização nacional das colocações era recomendável e urgente. Até porque permitiria abrir outros caminhos como, por exemplo, o de uma maior colaboração entre as Universidades e as escolas da sua região de forma a preparar, desde mais cedo, os alunos para os cursos que nos fazem falta, ajudando-os a evoluir logo no Secundário.

Este sistema implicaria uma maior responsabilização dos diferentes agentes envolvidos e não nos seria surpresa se permitisse corrigir outro problema bem referenciado: o insucesso escolar no primeiro ano da Universidade, em boa parte provocado por os alunos não estarem preparados para uma realidade tão diferente da do 12º ano.»
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